AUGUSTO STRESSER

AUGUSTO STRESSER

ÓPERA SIDÉRIA


A ópera SIDÉRIA fez estreia em 03 de maio de 1912, no Teatro Guayra (prédio antigo, hoje Biblioteca Pública do Paraná), na cidade de Curitiba/PR.

Obra de Augusto Stresser, foi originariamente escrita em 1909 em dois atos, em partitura para piano e vozes. Posteriormente, recebeu acréscimo de um terceiro ato e orquestração de Léo Kessler, adquirindo a forma final como foi apresentada a partir de 1912.

A ópera tem como pano de fundo a Revolução Federalista, que as cidades de Curitiba e Lapa haviam vivenciado poucos anos antes, com dramaticidade, no confronto conhecido como Cerco da Lapa. Por sua vez, o libreto conta a história de um amor romântico e trágico, no triângulo amoroso entre a jovem Sidéria, o idealista Alceu e o apaixonado Juvenal.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

ART NOUVEAU, início do século XX, em Curitiba



Em algum dia de 1909, na pacata cidade de Coritiba, o jovem Augusto Stresser sentou-se em sua bela escrivaninha, molhou em tinta sua caneta de bico de pena, e escreveu à mão as últimas notas que compunham canções de sua imaginação, árias e coros que contavam uma história de amor, morte e traição.
Três anos depois, às 21 hs do dia 03 de maio de 1912 e em sucesso retumbante, a elite cultural e política do Paraná acomodava-se nas cadeiras do Theatro Goayra, para assistir à elegante estréia da ÓPERA SIDÉRIA, a primeira ópera genuinamente paranaense. Na platéia, presente o Excelentíssimo Senhor Presidente do Estado. No espetáculo, solistas do Rio de Janeiro especialmente convidados, músicos da cidade e de outros estados, e um coro de cinqüenta vozes locais, cantores nos corais nas igrejas da cidade.
Mas como era Curitiba (ops! Desculpem, é o hábito! De novo...). Mas como era Coritiba, naquela primeira década do século XX? Que acontecia no mundo da arte, que influenciava o sensível Augusto em sua pacata cidade?

(Cartaz de Mucha)


O início do século XX é um período curioso. Para o passado ficava a tenebrosa herança da escravidão, e o mundo parecia mais justo sob o olhar abolicionista. E naqueles primeiros e alegres anos do início de século, nada havia que pudesse antecipar as duas terríveis grandes guerras mundiais que, ao final, tornar-se-iam os eventos marcantes do século XX. Mas um sentido de crise ainda paira no ar. Profundas mudanças sociais já são perceptíveis, surgiram os produtos, comércio e propaganda das primeiras revoluções industriais. É necessário lembrar que, embora a idéia da mudança tecnológica e de suas conseqüências seja usual para a contemporaneidade, era uma novidade sem precedentes históricos, para aqueles que viveram no limiar do século XX.

 
Em todo o mundo – e até mesmo na nossa pacata Coritiba! -, sente-se esta urgência do “novo” e do “moderno”, de forma tão ostensiva como a conhecemos hoje, no ambiente urbano. Com o advento da iluminação pública, e consequentemente dos dias mais extensos e também mais trabalhosos, até mesmo o espaço urbano passa a ser adequado aos “novos tempos”. Carros, telefones, fotografias e até cinemas mudam costumes antigos e arraigados. A pesquisa e utilização de opções tecnológicas mais adequadas resultam em uma nova estética, que torne visível a mudança de paradigma também na arquitetura, engenharia e urbanismo.

No início do século XX, os cânones artísticos e a hierarquia das Belas Artes, como impostos pelas Academias de Arte oficiais, havia resultado em uma mercantilização das obras de arte então produzidas. Os trabalhos aceitos e premiados nos salões oficiais seguiam cânones formais, em composições aparentemente uniformizadas, e transformaram a produção artística em uma mercadoria cada vez mais voltada ao benefício dos detentores de sólido poder financeiro, atendendo apenas ao mercado de encomendas do Estado ou de particulares. De certa forma, pode-se dizer que era uma arte de imitação, pomposa e estacionária.

Acrescente-se a este fato, que a pintura de cavalete – que resulta em uma obra autônoma de fácil transporte – havia rompido a tradição de séculos, em que a obra de arte era parte inerente da arquitetura. A separação da arquitetura das belas-artes teve resultado desastroso para a escultura. Neste período, à exceção do gênio de Rodin, não se tem a projeção de nenhum escultor (a), tampouco a execução de obras escultóricas significativas. Neste contexto, os artistas excluídos ou discordantes da política dominante no cenário artístico oficial, ou aqueles que não se mantinham imunes às mudanças sociais que presenciavam e sentiam necessidade de absorver e expressar através da própria produção artística, afastavam-se dos centros oficiais de arte e criavam espaços alternativos de exposição, troca de idéias e pesquisa, até o ponto em que a própria Academia e seus Salões oficiais passaram a perder o prestígio de antes.


No final do século XIX, a Europa viu surgir uma nova estética, a que muitos se referiam como a Arte Nova, e acabou registrada pela história como “Art Nouveau”. E é inegável que o movimento influenciou os artistas de toda uma geração, e tem uma memória surpreendentemente longa na sociedade, até hoje relembrada nostalgicamente como a Belle Époque. São deste período os cartazes publicitários de Mucha, os cartazes do Moulin Rouge por Tolouse Lautrec, as estamparias das telas de Klimt, as jóias e os vitrais de Vever, Tiffani e Lalique. 


(Vitral da Tifanny)



Entretanto, poucos artistas são especificamente identificados com o movimento. Curiosamente, a memória histórica registrou a temática da natureza estilizada, a estética orgânica das composições e artes aplicadas, os cartazes publicitários, móveis e jóias, linhas curvas e composições sinuosas, mais do quê o nome dos artistas que os produziram. 


É possível que para esta realidade, concorra o fato de que muitos dos artistas de vanguarda, com obras únicas e propostas inovadoras, tenham experimentado o estilo ou a temática em alguma fase de suas produções. Os artistas da Art Nouveau elegeram a flor estilizada, como o elemento predominante. E também de maneira definitiva, acrescentam-se as estilizações da árvore com as folhagens, o lis, a íris, a trepadeira, a papoula, o pavão (considerado uma ave-flor), predominando a linha ondulante. A figura feminina ressurge, com graça ondulante, sensualidade e delicada suavidade, cabelos em longas volutas, panejamentos em movimentos harmônicos.
  
A Art Nouveau, presente nas estamparias, na publicidade, nas jóias, na arquitetura e no urbanismo, acarretou uma verdadeira explosão de criatividade em todo o mundo, inclusive em nosso país.



 
(Victor Horta, detalhe de um portão)


Em Curitiba, além dos portões do Passeio Público, também o prédio do antigo Museu Paranaense (hoje Paço da Liberdade, restaurado pelo SESC) ainda preserva o estilo e a influência da Art Nouveau na cidade. 

 






E esta urgência do “novo” e do “moderno”, também foi sentida na música. E como uma passagem natural do romantismo precedente, os temas e melodias tornaram-se nacionalistas, buscando nas raízes de cada povo, de suas histórias, canções e harmonias, o som de um novo mundo.

Interessante observar que Augusto Stresser é contemporâneo de Villa Lobos. Em 1912, ano de estréia da ópera Sidéria, Villa Lobos estava com 25 anos e já com seu característico estilo modernista delineado. No ano seguinte, 1913, Heitor se casaria com a pianista Lucilla Guimarães. Em 1917 compôs Danças Características Africanas, e em 1917 (um ano antes do falecimento de Augusto Stresser), Villa Lobos terminou de compor os bailados Amazonas e Uirapuru.

Assim comparando, não é de estranhar a escolha temática de Augusto Stresser, pelo Cerco da Lapa e a história de sua amada cidade, tampouco o romantismo inerente e a feminilidade louvada, sob sua autoria.

SIDÉRIA, portanto, é uma ópera que reflete não só a sensibilidade de seu compositor, mas também a esperança da população da Coritiba do início de século, por inserir nossa pacata cidade em um ambiente de modernidade e cultura, e artisticamente atuante no cenário nacional.






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(referências bibliográficas)
[1] A Arte Nova, Champigneulle, B. Tradução de Maria Jorge Couto Viana. Editorial Verbo, 1984
[2] Do Rococó ao Cubismo, na arte e na literatura. Sypher, Wylie. Tradução de Maria Helena Pires Martins. Editora Perspectiva, 1980
[3] Arte Moderna. Argan, Giulio Carlo. Tradução Denise Bottmann e Federico Carotti. Companhia das Letras, 2ª reimpressão, 1993
[4] História Social da Arte e da Literatura. Hauser, Arnold, tradução Álvaro Cabral. Martins Fontes, 1ª edição abril de 1995, 4ª tiragem agosto 2003, Coleção Paidéia.
[5] Profissão Artista, Pintoras e Escultoras Acadêmicas Brasileiras. Simioni, Ana Paula Cavalcanti. EdUsp/Fapesp – 2008.